quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

O fermento ideal


Ela tinha um monstro dentro de si que parecia indestrutível. Isso porque sabia enganá-la muito bem, sabia como se manter vivo. O ódio dela pelo monstro era claro, e sempre que podia ela parava de alimentá-lo, não importava o quanto a machucasse, já que ele era parte dela.
Mas as boas intenções dela não eram o suficiente. O monstro era alimentado por outras pessoas ao seu redor - pelos monstros de cada uma delas que queriam apenas alguém com quem dividir a brincadeira. E ele, baixinho, dizia no ouvido dela que seria só por pouco tempo, que não ficaria acordado até tarde. O monstro era sedutor, era divertido, sensível. Ela podia senti-lo acariciar sua nuca e pedir que ela só relaxasse.
Ela relaxava. Relaxava porque quando o monstro estava acordado dentro de si as pessoas elogiavam seu sorriso com mais frequência. As pessoas a convidavam para festas, a abraçavam mais, a saciavam mais. O que importava se o monstro estava sendo alimentado? Talvez os dois pudessem formar uma dupla!
Problema é que ela era muito pouco para ele, muito chata quando estava sozinha, muito pensativa, muito carente. Ele só a queria quando ela o ignorava: era definitivamente mais divertido - como um troféu depois de ganhar um jogo.
Assim era como o monstro a consumia, a cobrindo com um tipo de dúvida cruel demais para se sanar. Ela poderia a) alimentá-lo mais para vê-lo ficar satisfeito e gostar dela; ou b) deixá-lo definhar. Qualquer caminho que ela escolhia a fazia sofrer.
Deixando-se influenciar tanto pelo monstro dentro de si, indo e voltando tantas vezes, ela se achava, aqui e ali, sentindo falta das pessoas que a amavam de verdade. Aquelas que davam o sangue para batalhar junto a ela contra o monstro, e que aproveitavam cada vitória para ajudá-la a conhecer-se sem ele. Mas nas vezes que, sem perceber, ela mudava de lado durante a batalha, alguém acabava indo embora de sua vida.
Ela tinha um monstro dentro de si que parecia indestrutível, mas não existe uma pessoa sequer que também não tenha um, todos do mesmo tamanho, da mesma intensidade e igualmente assustador. Ninguém também é capaz de matá-lo, mas fazê-lo adormecer é quase tão importante, e fazê-lo adormecer um pouco mais cada dia, porque é nesse processo que começamos a tirar uma lição com a existência do monstro.

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