Notou-se cedo que ele era um imã de confusões. Ainda menino eram poucas as vezes que não voltava para casa com os joelhos ralados ou olhos roxos. Tinha sempre as ideias mais perigosas, era atraido pelos colegas aventureiros; nunca pelos cautelosos. Era criativo, brilhante, curioso, mas influenciável, porque gostava de ter a quem culpar se algo desse errado. E sempre dava.
Sua mãe sabia de todos os seus atributos e talvez por isso não conseguisse lhe largar o pé. "Ele tem imã para confusões", dizia quando alguém ousava se meter em seu estilo de educação para criticar seu zelo exagerado. Mas esse zelo se devia apenas pelo fato de que ela o conhecia bem demais. Ele tinha mesmo imã para confusões e se largasse dele por um segundo sabia que algo errado podia acontecer. O teve já fora de idade, era filho único, bonito como o pai. E zelava dele pela simples razão de amá-lo.
Ele às vezes não entendia, chegou a fugir dela por um tempo para livrar-se daquilo tudo, mas sua sina o acompanhou, e ele voltou aos braços dela depois de ter atingido o fundo do poço. Se destruiu, se perdeu, caiu em sofrimento. Percebeu que precisava do amor de sua mãe.
O menino cresceu, continuou se metendo em problema atrás de problema, e a cada um ele via a mãe chorar. Ela chorava de medo, medo por ele. Ele chegou a se ajoelhar na frente dela e prometer que não a deixaria. "Não conseguiria viver sem você", ele disse. E não importava o quanto soubesse que ele era inconstante, aceitou a promessa.
Mas então houve um dia em que ele se pegou olhando no espelho e percebendo que não se conhecia longe da asa de sua mãe. Não podia ficar ali para sempre, já era adulto e precisava caminhar com as próprias pernas. Precisava de alguns amigos - não dos aventureiros e destemidos, mas daqueles que encaram a aventura mesmo morrendo de medo - e de uma nova vida. Foi assim que, sem avisar, fugiu. Desapareceu, foi para onde não o encontrassem. Sabia que a estava decepcionando, mas foi mesmo assim.
E aquela mãe ficou esperando. Deixava ir a mil o coração a cada toque do telefone, chorava a cada vez que a campainha fazia barulho e procurava pelo rosto dele em cada multidão pela qual passava. Os anos se foram assim, e chegou um tempo que ela parou de esperar. Ficou louca, esquecida; perguntava o nome do marido três vezes no mesmo dia.
Sentada em sua cadeira de balanço que rangia a cada movimento, esqueceu que teve um filho.
E quando ele finalmente resolveu voltar, arrependido, ela não o conhecia mais e não quis um estranho em sua casa. Alguns dizem que ela fingia a loucura para não ter de lidar com os anos em que ele se manteve quebrando a promessa de que não a deixaria, não ter de lidar com o fato de que aquilo tudo que ele lhe dissera era mentira, aquilo de que não podia viver sem ela.
Mas se era fingimento, ela se manteve firme a ele até o fim. Não importava o quanto ele chorasse dizendo que a amava, ela não reconhecia mais aquela voz. E antes de morrer ela disse em voz alta: "vou, mas vou em paz, porque não deixei nenhuma alma para chorar por mim".
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